No Médio Oriente está a decorrer uma catástrofe em tempo real
Texto de Jeremy Corbyn.
Dia sim, dia não, os cabeçalhos resumem a carnificina mais recente: o número de vidas perdidas, as pessoas deslocadas, os lares destruídos – acompanhados de mensagens grosseiras, fúteis e insensíveis por parte dos políticos.
Esta semana é sobre Gaza, bombardeamentos, mortos e desespero. Há duas semanas, era sobre a Rússia e a Ucrânia.
Pessoas desesperadas ainda estão a tentar sobreviver e a necessidade de uma solução diplomática e pacífica nunca foi tão necessária.
Algumas guerras fora do radar da nossa comunicação social – Sudão, Congo, Iémen – nem sequer têm direito a ser noticiadas. Contudo, há pessoas de luto pelas crianças e pais que morrem nesses conflitos.
A 7 de Outubro, testemunhamos o horror da morte de 1.400 pessoas no Sul de Israel, com quase 200 sobreviventes levados como reféns.
Este ataque deplorável causou uma agonia inimaginável àqueles que perderam os seus entes queridos e uma angústia permanente àqueles que anseiam por se voltar a ver.
Em reacção, o governo e Exército israelitas entraram em campo e anunciaram que iriam destruir Gaza, a coberto de uma guerra contra o Hamas.
Até à data, foram mortos mais de 3.000 palestinianos. Isto em cima dos milhares de palestinianos que foram mortos ao longo da última década. Não só em Gaza, mas também na Cisjordânia. A política da guerra total parece ser a única possível.
Os apelos a um cessar-fogo por parte dos países vizinhos, da ONU e líderes políticos do Sul global têm sido resolutamente rejeitados por Israel.
O governo brasileiro de Lula da Silva tem tentado de modo consistente ajudar a que acabem as mortes, não só nesta guerra mas também na Rússia e na Ucrânia.
Como actual presidente do Conselho de Segurança da ONU, o Brasil redigiu uma moção para um cessar-fogo negociado com toda a determinação, alterando até o termo para “pausa humanitária”. Os Estados Unidos vetaram. O Reino Unido absteve-se.
No dia seguinte, o presidente dos EUA, Joe Biden, chegou a Tel Aviv no Airforce One, abraçando entusiasticamente Benjamin Netanyahu e proclamando o seu total apoio a Israel.
A presidência dos EUA comprometeu-se com navios de guerra e armamento para a protecção de Israel e a sua ocupação, ilegal e continuada. A União Europeia fez o mesmo.
Rishi Sunak também sentiu a necessidade de ir a Tel Aviv dar o seu voto de confiança e o de toda a Grã-Bretanha. Pelos seus lábios não passaram quaisquer palavras de paz; só de mais e mais dinheiro para armamento.
A parcos minutos de distância por avião, continuavam a cair bombas no Sul. Centenas de mortos, milhares a fugirem com os seus animais e pertences. O abastecimento de água a secar, as reservas de comida a desaparecer, sem acesso a medicamentos. Tal é a profundidade do horror que está a decorrer que médicos, ousados, estão a efectuar cirurgias de emergência sem anestesia. A maré de desespero humanitário está a assoberbar qualquer possibilidade de ajuda.
A vasta maioria das pessoas de Gaza são descendentes da Nakba, o dia em que 700.000 pessoas foram expulsas do sítio que agora é Israel.
Quer ocupada ou sob cerco há décadas, é uma das zonas mais densamente povoadas do mundo. Uma população extremamente bem formada que depende da comida e da educação da ONU e do seu próprio engenho para sobreviver. O Exército israelita, com tanques, mísseis, apoio aéreo e drones está prestes a mover-se para Sul e deslocar um milhão de pessoas para o Norte de Gaza.
Quanto tempo demorará até que toda a população de Gaza seja obrigada a cruzar a fronteira para o Sinai e uma nova Gaza seja construída de Rafah a Rashid, estendendo-se para Sul? Estamos a testemunhar outra Nakba? Outra expulsão forçada do povo palestiniano?
Todos os horrores e homicídios das últimas duas semanas têm de ser vistos à luz do contexto da ocupação da Cisjordânia e dos campos de refugiados que se amontoam há 70 anos na Jordânia, na Síria e no Líbano.
Qualquer paz após um cessar-fogo deverá terminar com o fim da ocupação e – como é descrito por várias organizações internacionais – com o fim do sistema de Apartheid. Deverá também obter justiça para os refugiados e para a Diáspora palestiniana.
Se puderem, juntem-se a mim na manifestação em Whitehall. Se puderem, contribuam para o Apoio Médico à Palestina ou à Assistência Islâmica. Seja qual forem os abusos que a comunicação social nos dirigir e o quer que seja que digam acerca de nós, dezenas de milhar estão a protestar para que se pare de matar.
Estaremos lá para lamentar a morte de todas as baixas civis. Estaremos lá para amplificar os apelos feitos pelos sindicatos palestinianos ao mundo: parem de armar Israel. E estaremos lá – negros, brancos, homens, mulheres, muçulmanos, cristãos e judeus – unidos na nossa exigência por um cessar-fogo imediato.
Milhões de pessoas em todo o mundo estão chocadas pelo homicídio de jovens judeus e pelos reféns capturados em Negev e estão igualmente chocados com as bombas que chovem sobre Gaza.
Está a decorrer uma catástrofe humana ao vivo na televisão, corpos a serem retirados de hospitais e escolas que pessoas inocentes julgaram ser santuários, pelo menos temporários, do horror.
Iremos manifestar-nos o tempo que for necessário para acabar com as mortes indiscriminadas. Para trazer um fim à ocupação. Para trazer uma paz justa e duradoura.
Jeremy Corbyn
Jeremy Corbyn é deputado do Parlamento Britânico eleito pelo círculo de Islington North, ex-líder do Partido Trabalhista britânico.
Publicado originalmente no diário Morning Star a 21 de Outubro de 2023.